sábado, 4 de junho de 2016

Impeachment - A Defesa de Dilma - Parte II

Eduardo Cardozo reconhece a limitação de poder

Na lei inglesa, no início da monarquia, dizia-se que o Rei não errava. Cardozo reconhece, no trecho abaixo, esta limitação:

"Todavia, no âmbito de um Estado Democrático de Direito, seria contraditório e irrazoável que restasse consagrada a irresponsabilidade absoluta do Presidente da República em relação aos atos que pratica no exercício da sua competência, rememorando vetusta e ultrapassada concepção ("the killg can do no wro!lg''). Se, por um lado, o regime presidencialista impõe garantias que permitam a estabilidade institucional do exercício da chefia de Estado e de Governo, de outro, o limite ao exercício do poder presidencial também deverá ser afirmado, nos casos excepcionais em que o comportamento presidencial, de forma grave e dolosa, possa atingir fortemente as vigas mestras que sustentam a ordem constitucional. Afinal, "para que não se possa abusar do poder, é preciso que, pela disposição das coisas, o poder refreie o poder".

Ora, como advogado ele TEM QUE TER UM POUCO DE BOM SENSO.

Inclusive, tardiamente, reconhece na página 7 da defesa o artigo 85, do qual fala:

"Determina o art. 85 da nossa Carta Constitucional que a responsabilização do chefe do Poder Executivo apenas poderá ocorrer nos casos de crimes de responsabilidade, entendendo-se por estes "os atos do Presidente da República" que "atentem contra a Constituição Federal". Uma vez incorrendo a Presidenta da República nestes delitos, será processada e julgada pelo Senado Federal (processo de "impeachment''), "limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação por oito anos, para exercício da função pública", conforme preconizado no art. 52, I, e parágrafo único da Constituição Federal".

Reconheceu então ? Mas e agora ? Lembrando deste artigo, ele admite a condenação que vem no horizonte. Então entra o toque da meia-verdade, de usar a própria verdade fora de sua finalidade, como disse a serpente à Eva: "mas foi assim que Deus disse ?". Vejamos qual é a tática de Cardozo.

"Embora o art. 85 da nossa lei maior tenha, em sete incisos, feito uma referência a estes crimes de responsabilidade, acabou por esclarecer, em seus próprios termos, que esta menção se deu em caráter meramente exemplificativo. De fato, esta atribuição foi deferida a uma lei especial (Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950). Todavia, ao assim proceder, não deixou de delimitar o nosso legislador constitucional, neste mesmo dispositivo, com absoluta clareza, que a liberdade para a tipificação destes delitos, seja para o legislador ordinário, seja para o eventual exegeta das normas constitucionais e legais, não seria irrestrita. Isto porque, deixou duvidoso:"

Perceberam a tática da "serpente de Dilma" ? O final do parágrafo "Isto porque, deixou duvidoso".

Entretanto, lendo a introdução do artigo 85, o enunciado reza que:

"Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra"

O texto frisa "e, especialmente, contra".

Qualquer aluno do ciclo básico (que vai até a nona série) sabe que "especialmente" serve para chamar a atenção sobre algo que vem a seguir.

Dando o direito ao ilustre advogado, vamos ver que pontos ele cita:

"a) que somente poderiam ser definidos como crimes de responsabilidade capazes de ensejar a responsabilização da Presidenta da República, condutas tipificadas em lei. Aplica-se, portanto, a esta particular espécie de delitos o brocardo nullum crimen sine tipo (não há crime sem a tipificação legal da conduta);"

Com isto ele quer dizer que os itens do artigo 85, reproduzido a seguir

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
IV - a segurança interna do País;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
V - a probidade na administração;
IV - a segurança interna do País;
V - a probidade na administração;
VI - a lei orçamentária;
VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

não tipificam o crime de responsabilidade. Porém, ele se esqueceu que o item VI tem um substantivo bem contundente em relação ao orçamento:

A PALAVRA LEI

Se não houvesse esta citação a um objeto "manipulado" o tempo todo por advogados, nos poderíamos até abrir uma "janela" por onde poderiam entrar os raios do "Sol da dúvida". Porém, não é o caso. Existe uma Lei Orçamentária votada pelo Congresso Nacional.

Continuemos a dar a chance ao ilustre advogado:

b) que a própria lei ou seus intérpretes não poderiam pretender tipificar quaisquer atos irregulares ou ilegais praticados por órgãos ou outros agentes do Poder Público como "crimes de responsabilidade". Deveras, a norma constitucional é clara ao afirmar que apenas podem ser caracterizados como delitos desta natureza atos que sejam diretamente praticados pela Presidenta da República (a expressão acolhida no precitado art. 85 é, in verbis, ''atos do Presidente da República", identificando, assim, o único sujeito passível de, com sua conduta pessoal, possibilitar a tipificação de tais atos delituosos);

Lembramos ao leitor que a palavra determinante na tipificação que o item VI do artigo 85 é eficiente e completo é LEI. E o ilustre advogado é obrigado a iniciar seu item (b) com a expressão "a própria lei". Este é o "ato falho" de quem, como profissional que lida com leis não consegue negar.

E a lógica utilizada ? O leitor consegue perceber ?

Usamos apenas o que ele mesmo diz: "apenas podem ser caracterizados como delitos desta natureza atos que sejam diretamente praticados pela Presidenta da República".

Guardem este trecho, pois o advogado pretende usá-lo como apoio para o item (c) da sua defesa em favor de Dilma:

"c) que a própria lei ou seus intéi-pretes não poderiam pretender tipificar como "crimes de responsabilidade" quaisquer atos irregulares ou ilegais praticados pela Presidenta da República. Estes atos, para receberem tal qualificação, devem se revestir da condição de serem indiscutivelmente um "atentado à Constituição". Ou seja: não podem ser quaisquer violações a regras constitucionais, legais ou regulamentares, mas atos que pela sua intensidade, gravidade e excepcionalidade atentem contra princípios essenciais da nossa ordem constitucional, de modo a subvertê-la profundamente;"

Será que Cardozo aguarda uma "próxima edição da Constiutuição, onde a redação do artigo 85 inicie da forma que sugerimos abaixo ?

"Art. 85. Constitui atentado do Presidente da República os seguintes atos:"

Talvez ele tenha sido, e continue, a ser um péssimo aluno de interpretação de textos e de semântica das palavras. Perguntamos:

O que quer dizer a expressão:

"São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem"

Consultando o Dicionário Priberam, obtemos:

3ª pess. pl. pres. conj. de atentar
3ª pess. pl. imp. de atentar


"atentem", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/dlpo/atentem [consultado em 05-06-2016].

Ora, ora, ora, não é que o verbo atentar dá origem ao substantivo atentado ? Era isto que Cardozo queria ? Constata-se então que o ilustre advogado se vale de um sofisma. O texto constitucional menciona "atentem", e o leigo, o homem do povo, o eleitor iletrado nunca vai associar o verbo "atentar" a "atentado".

Mas ainda assim, queremos dar oportunidade dele poder ter razão, e talvez êxito em sua defesa, pois ele diz:

" um "atentado à Constituição". Ou seja: não podem ser quaisquer violações a regras constitucionais, legais ou regulamentares, mas atos que pela sua intensidade, gravidade e excepcionalidade atentem contra princípios essenciais da nossa ordem constitucional, de modo a subvertê-la profundamente;"

Percebam a manipulação. Para ele, um item de um artigo foi violado, mas não a "Constituição Inteira". Dizer isto seria ato equivalente a considerar inocente um homicida doloso, pois violou tão somente o artigo 121 do Código Penal. Para ser considerado culpado SEGUNDO A LÓGICA DESTE ARREMEDO DE ADVOGADO, o sujeito em questão teria que ter matado a vítima, roubado a mesma, e cometer atos que violassem o Código Penal na Íntegra.

Nos desculpem os leitores, mas isto é "atentar" contra a nossa inteligência.

E ele continua (pois os admiradores de Dilma e de Lula parecem estar dispostos a desprezar a lógica, quando se trata de seus dois ídolos):

"d) que a própria lei ou seus intérpretes não poderiam tipificar como "crimes de responsabilidade" quaisquer atos praticados pela Presidenta da República fora do "exercício das suas funções" na "vigência do seu mandato", por força da já referida regra estabelecida no artigo 86, § 4º, do mesmo diploma constitucional. Deste modo, também ficaram excluídas desta tipificação delituosa os atos de autoria da Chefe do Executivo que pmventura tenham sido por ela praticados em período anterior, ou se reputem estranhos à sua função mesmo que praticados durante a vigência do seu atual mandato;"

(1) Talvez, no momento de assinar os decretos, Dilma tenha "se licenciado do cargo por conta própria", portanto não estava no exercício de suas funções cpomo Presidenta, ou (2) como o ato foi praticado no apagar das luzes de seu mandato anterior, a eleição anulou o ato anterior. Matematicamente, existem então duas Dilmas. A Dilma do primeiro mandato é a Dilma1, e a Dilma do segundo mandato é a Dilma2. A Dilma1 é culpada, pois assinou os decretos. Esta de agora é inocente, pois não mais o fez.

Podemos dar a isto o nome de "esquizofrenia de mandato". A cada mandato o presidente, se reeleito, não é mais o mesmo. Traduzindo: EDUARDO CARDOZO ACHA QUE TODOS NÓS SOMOS PALHAÇOS.

E finaliza seus itens quanto à respónsabilidade:

e) que a própria lei ou seus intérpretes não poderiam tipificar como "crimes de responsabilidade" atos meramente culposos, ou seja, atos que não revelem uma real e grave ação dolosa da Presidenta da República contra a ordem constitucional estabelecida. Deveras, careceria de completo significado constitucional imaginar-se que não seriam apenas atos dolosos os passíveis de serem tipificados como capazes de ensejar um ato extremo de afastamento de um chefe de Estado e de Governo. A mera conduta negligente, imprudente ou imperita da Chefe do Executivo não poderá nunca, no sentido jurídico adequado da expressão, em face da sua própria excepcionalidade sistêmica, vir a qualificar um verdadeiro "atentado à Constituição Federal".

Este é o seu item mais próximo da fala melíflua da "serpente do Éden" (aquela que enganou Eva). Usando um recurso de um caráter tão imbecil (a palavra tem que ser usada). Crime contra a Constituição não se tipifica em CULPOSO ou DOLOSO, pois isto se reserva somente ao Código Penal. Quando o candidato ao cargo máximo de representatividade do Estado é diplomado, ele tem consciência absoluta daquilo que o aguarda, e jura cumprir a Constituição, Norma Máxima do Governo e do Estado. Portanto, valeu a intenção de sofismar e deturpar a letra da lei do senhor Cardozo, mas ele falhou.

Suponhamos que houvesse o crime culposo contra a Constituição. Teríamos a pena de Impeachment de 1, 2, 3 ou 4 anos (pena máxima ?). Portanto, vê-se claramente o absurdo do argumento deste "advogado".

O que corrobora a intenção da presidente é o fato de ter utilizado das pedaladas em 2014 e 2015, nos seus doze meses. Não foi somente em um ano, mas em dois. Ou seja, ela sabia que estava fazendo.

E, chocados, encerramos esta segunda parte da análise da defesa de Dilma Roussef.

Parte I






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